segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Mesmo corpo, vários genomas

Estudos publicados nos últimos três anos revelam que um mesmo indivíduo pode ter em seu corpo células com DNAs diferentes. Conhecer o padrão dessas "mosaicos genéticos" pode ajudar no tratamento e diagnóstico de doenças e até em investigações policiais


Desde que os biólogos James Watson e Francis Crick descobriram a estrutura do DNA em 1953, os cientistas supunham que todas as células do corpo de um indivíduo saudável possuíam o mesmo genoma, uma cópia exata da receita original, presente no embrião. Eventuais mutações, acreditavam, teriam consequências drásticas, como o surgimento de tumores. Descobertas feitas nos últimos anos, no entanto, revelam que uma pessoa pode normalmente carregar vários DNAs espalhados pelo seu corpo, resultado de mudanças sem fim em seu código genético. Pesquisadores já encontraram essas mutações em diversos tecidos do corpo humano, como cérebro, pele, sangue e rins. Conhecer o padrão desse mosaico genético pode ajudar no diagnóstico e tratamento de doenças e até em investigações policiais.
Todo animal nasce a partir do encontro de um óvulo com um espermatozoide, de que resulta seu DNA original. Até a última década, os pesquisadores reconheciam apenas um DNA por indivíduo, replicado com perfeição — nucleotídeo por nucleotídeo — por todo o corpo. “As apostilas de genética deixavam claro que todas as células deveriam ter o mesmo genoma. Podia haver algumas poucas exceções, como as células reprodutivas e algumas do sistema imunológico, mas a história terminava aí”, afirma Alexander Urban, professor de psiquiatria e genética na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, e autor de algumas das principais pesquisas sobre a variação no DNA humano. Uma das exceções conhecidas pelos pesquisadores desde os anos 1950 é o quimerismo, que ocorre quando dois embriões que dariam origem a gêmeos se fundem no útero materno, gerando um único indivíduo com dois DNAs diferentes espalhados pelo corpo.
Nos últimos cinco anos, no entanto, os pesquisadores descobriram que variações do DNA não são incomuns, nem necessariamente danosas. “Quase todas as pessoas possuem algumas dessas variações espalhadas pelo corpo. Ainda não podemos afirmar categoricamente o número de mutações ou de pessoas que as carregam, mas as temos encontrado na maioria dos estudos que fazemos. Deve levar entre cinco a dez anos para que tenhamos dados mais precisos”, afirma Urban.
Embora seja um campo de estudo relativamente novo — os estudos mais robustos não possuem mais do que três anos —, os pesquisadores já foram capazes de catalogar uma série dessas variações. Em um dos estudos que contaram com a participação de Urban, os cientistas valeram-se da autópsia de seis indivíduos para mapear a variedade genética de seus órgãos. Em cinco dos seis corpos foram encontradas mutações. “Isso não quer dizer que os genomas dos órgãos sejam completamente diferentes. Em um dos casos, por exemplo, nós encontramos alterações em apenas cinco pares de bases que compõem o DNA dos rins e do fígado. Perto dos três bilhões de pares que compõem todo o genoma, é muito pouco”, diz Urban.


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